sexta-feira, 29 de maio de 2015

Novas possibilidades em tempo de mobilidade



Os conceitos de lugar e espaço muitas vezes se confundem, é difícil se chegar a um consenso. De qualquer forma, os dois termos estão ligados à ação humana. A forma como o indivíduo percebe e lida com o território diz muito sobre a cultura de um povo. A identificação com uma determinada cultura, inclusive, durante muito tempo era tida somente dentro das fronteiras de um território. Com o advento da globalização e, posteriormente, da internet, a percepção de cultura e identificação se alterou drasticamente.

O conceito de pós-modernidade segundo Stuart Hall dialoga com essa nova noção de identificação, num âmbito mais amplo. Em sua obra “A identidade cultural na pós-modernidade”, Hall aponta que o descentramento do sujeito e a fragmentação das formas modelares construídas na modernidade são pontos-chave desse novo momento da história. A sociedade já não era mais feita de pilares bem definidos e sólidos, logo, o modelo do sujeito e da identidade não poderia sê-lo. Aos poucos foi se descobrindo que as identidades são fluidas, mutáveis, construídas socialmente, podendo ser articuladas de acordo com o papel social desempenhado. 

Hall também expõe a influência da globalização no ato de desmontar essas identidades. A globalização atravessa fronteiras, integra comunidades, promove uma nova configuração de espaço-tempo - a chamada aceleração - e promove três possíveis consequências para essas identidades: ou elas se desintegram, ou se reforçam para resistir à globalização, ou caem em declínio, em favor das identidades híbridas. A compressão espaço-tempo afetou a formação das identidades e separou o espaço do lugar, afrouxando as relações com a cultura nacional e levando ao surgimento de laços “globais”.

Com o fácil acesso aos costumes de diversos povos e países, hoje é muito mais fácil se identificar com diversas culturas. Os dispositivos móveis contribuem com isso a cada dia. Por serem portáteis, é fácil carregar “um pedacinho do mundo” próximo a nós todo o tempo. Em seu ensaio “Polegarzinha”, Michel Serres traz um retrato dessa nova geração, nascida na era da fragmentação do conhecimento. "Por celular, têm acesso a todas as pessoas; por GPS, a todos os lugares; pela internet, a todo o saber: circulam, então, por um espaço topológico de aproximações, enquanto nós vivíamos em um espaço métrico, referido por distâncias" (SERRES, 2013, p. 19).

Outro aspecto dessa transformação é citado por Serres em suas elucubrações sobre como recriar o ensino para essa nova geração. "Com o acesso às pessoas pelo celular e com o acesso a todos os lugares pelo GPS, o acesso ao saber se abriu. De certa maneira, já está o tempo todo e por todo lugar transmitido" (SERRES, 2013, p.26). Assim, as “formas modelares” do ensino tradicional já não servem a esses jovens. Os computadores que carregam na palma de suas mãos são capazes de lhe trazer informação a todo tempo.

São vários os aplicativos responsáveis por essa tarefa. O Feedly agrega feeds de diversos blogs e sites, escolhidos pelo usuário, que age como seu próprio gatekeeper. O Nuzzel destaca e organiza as notícias mais compartilhadas pelos seus contatos nas redes sociais. E se você não puder estar online o tempo todo - o que é cada vez mais difícil hoje em dia -, não há problema: você pode salvar as notícias no Pocket, para ler offline no seu celular. Pra saber mais sobre aplicativos, visite o blog Aplicatividade, dos nossos colegas de disciplina. Mas nem é necessário usar esses apps para ter informação e conhecimento na palma da mão: às vezes as notícias chegam até pelas redes sociais.

O grande problema é que, nesse estilo de vida “on the go”, nem sempre é possível apurar corretamente a informação que chega pelas redes, como já foi dito anteriormente em nossos posts. A recepção é rápida, não há muito tempo pra digerir, e aquilo que foi recebido se torna só uma vaga ideia no repertório de uma mente fragmentada. Não costuma haver tempo para maiores pesquisas. Além disso, torna-se mais fácil compartilhar informação falsa. Sem a onipresença da instituição jornalística, com a absoluta facilidade de criação de conteúdo e considerando o fato de que é muito comum que as pessoas compartilhem conteúdo sem sequer abrir o link, confiando apenas no título, a mobilidade informacional mostra seu lado menos aprazível.

Mas esses novos tempos de mobilidade não pressupõem apenas um maior acesso à informação. Agências de publicidade e empresas de marketing em geral estão investindo cada vez mais no universo dos dispositivos móveis, de diversas maneiras. Uma delas é o SMS Marketing, no qual os usuários recebem alertas de promoções e cupons de desconto por SMS. Outra, mais recente, é o uso de anúncios dentro de aplicativos móveis, sejam daqueles que ficam no rodapé das telas dos apps ou que surgem em forma de vídeos. Algumas, não muito usadas, aproveitam-se justamente das características “móveis” dos dispositivos. É o caso de abordagens baseadas em geolocalização, ou do marketing via bluetooth.

O filão da publicidade móvel está em franca expansão, e os números comprovam isso. O faturamento com a publicidade em dispositivos móveis duplicou em 2013, alcançando US$ 17,9 bilhões, puxado por Facebook e Google, segundo pesquisa divulgada pela consultoria eMarketer. O gasto com publicidade em plataformas móveis teve um aumento de 105%. Facebook e Google lideraram esse mercado, somando US$ 6,9 bilhões em 2013.

Será possível, numa visão um tanto pessimista, relembrar Milton Santos em “Por uma outra globalização” e presumir que o desenvolvimento da técnica e da tecnologia é puramente um projeto de expansão do capitalismo à escala global? Talvez. Mas também é inegável que os novos tempos de mobilidade informacional criam novas regras, novas consciências e talvez venham a criar um novo mundo. Só o tempo dirá o que está por vir.

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